MATÉRIA SOBRE A CRISE FINANCEIRA NA PREFEITURA MUNICIPAL DE SALVADOR - JORNAL A TARDE - DOMINGO 07/11/2010
Sem receita e novos investimentos, Prefeitura de Salvador enfrenta crise
Insatisfação de servidores e alto custo com comissionados são problemas para o prefeito
REGINA BOCHICCHIO
A praticamente dois anos do término da gestão de João Henrique Carneiro (PMDB), no poder desde 2005, a Prefeitura de Salvador – que não conseguiu aumentar de forma significativa receita e investimentos –, agoniza em meio à insatisfação de servidores, baixa receita e alto custo com terceirizadas e comissionados.
O balanço quadrimestral da Secretaria da Fazenda (Sefaz) que será apresentado amanhã, às 9h30, na Câmara Municipal, não deve estar distante do anterior que apontava R$ 2,2 bilhões arrecadados de janeiro a setembro de 2010 e dos gastos de R$ 2,01 bilhões no mesmo período, conforme site municipal Transparência.
Na diferença, apenas R$230 milhões supostamente livres.
Pouco para uma cidade de quase 3 milhões de habitantes que tem infraestrutura e transporte precários, déficit de 100 mil moradias e uma ocupação desordenada de 70 700 mil unidades habitacionais (dados do CREA).
Não bastasse, a suspeita de uso indevido da Transferência do Direito de Construir (Transcon), por empresários, pode ter lesado os cofres municipais em R$ 500 milhões (leia abaixo), denúncia que está sendo apurada pelo Ministério Público (MP).
Pensada pelo vice-prefeito Edvaldo Brito(PTB), a reforma tributária implementada a partir de janeiro de 2010 ainda não expôs publicamente seus frutos – embora a arrecadação tenha aumentado em 12,5% entre os meses de agosto de 2009 e 2010 (Transparência).
A reportagem tentou contato com Brito, por telefone, no início da noite de sexta, mas ele não atendeu às ligações. Questionada,a Sefaz afirmou que daria dados na apresentação do balanço. A TARDE falou como secretário do Planejamento, Reinaldo Saback, que afirmou que o assunto é com a Sefaz.
Responsabilidade
Embora o gasto com pessoal da prefeitura esteja em 35%, faixa distante do limite prudencial de 51% previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (ou seja, pode gastar mais com pessoal), a gestão não conseguiu recursos para pagar as promessas feitas aos 22 mil servidores como o reajuste retroativo de 33,3% (distorção salarial entre servidores de 30 e 40 horas) para efetivos da Guarda Municipal, Transalvador e Sucop.
“Não houve implementação de um plano de saúde para os servidores, já aprovado na Câmara. Problemas rotineiros como o não fardamento dos guardas municipais, ausência de equipamentos de proteção individual não foram resolvidos”, aponta Gustavo Mercês, diretor do Sindicato dos Servidores da Prefeitura de Salvador.
Trabalhadores de empresas terceirizadas sofrem atraso de salário. A responsabilidade seria da gestão anterior.
“A prefeitura, nas mesas de negociação, alega que as contas operam no vermelho, que não há margem para garantir pleitos, que os atrasos são de responsabilidades das empresas terceirizadas e que as últimas gestões acabaram gerando um déficit que prejudica a atual gestão”, revela Gustavo.
Máquina administrativa apresenta sinais de inchaço
Ao mesmo tempo em que anda no vermelho, a máquina administrativa do prefeito João Henrique é inchada. Segundo o Tribunal de Contas dos Municípios (TCM),em dezembro de 2009, só na Casa Civil eram 132 comissionados que representavamum gasto mensal de R$ 631,5 mil. Ocupavam cargos comissionados, dentre outros, o ex-vereador Silvoney Sales (PMDB) e Ricardo Grey(PTC), vice-presidente do partido. Efetivos, na mesma época, eram 176 e representavam gasto mensal de R$ 302,8 mil, ou seja, a metade do que gastava com os primeiros. Os gastos com comissionados não foram atualizados em 2010.
Em outro aspecto, se a folha de pagamento dos 22 mil efetivos representou, de janeiro até setembro de 2010, mais de R$ R$ 790 milhões, só com serviços de terceiros – cujo número de pessoas e empresas que trabalhamnão são divulgados – a prefeitura gastou quase R$ 454 milhões.
Lição de casa
Na avaliação do auditor Sergio Furquim, diretor do InstitutodosAuditores Fiscaisda Bahia, embora a receita do município de Salvador seja baixa em relação à sua demanda, a primeira regra seria a de cortar despesas.
“Esqueceram de fazer a lição de casa: se não existe trabalho comvistas a aumentar a receita e cortar despesa, numa situação como a de Salvador, não tem jeito”, diz ele.
Por aumento da arrecadação entende-se atrair investimento da iniciativa privada, diferente de onerar tributos.
Ele cita como exemplo a Prefeitura de São Paulo que está licitando espaços publicitários nos pontos de ônibus e vai garantir R$ 10 bilhões em 20 anos só em propaganda, sem gastar nada.
Hoje, a maior arrecadação de Salvador vem do Imposto Sobre Serviços (ISS), Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e taxas diversas. Um caminho seria o de atrair novas empresas dentro de uma vocação natural que é a do turismo. “Para atrair investimentos, porém, não pode haver orla destruída e um Pelourinho arrasado,por exemplo”, lembra Furquim.
Nenhum comentário:
Postar um comentário